O ex-delegado-geral da Polícia Civil, Ruy Ferraz Fontes, foi assassinado em Praia Grande; crime envolveu armamento pesado, perseguição e expõe a ousadia do crime organizado.
A noite de segunda-feira (15) no litoral paulista terminou marcada pela violência que há anos o ex-delegado-geral da Polícia Civil de São Paulo, Ruy Ferraz Fontes, enfrentou de frente. Aos 63 anos, ele foi executado em Praia Grande, em uma emboscada que trouxe à tona não apenas a brutalidade da ação criminosa, mas também o peso de uma trajetória dedicada a combater a maior facção criminosa do país. A morte de Fontes é mais do que a perda de um homem: é um duro golpe na sensação de segurança e um alerta sobre o poder do crime organizado.
A perseguição e os tiros de fuzil
Fontes deixava a Prefeitura de Praia Grande, onde ocupava o cargo de secretário de Administração, quando foi perseguido por criminosos. O carro em que estava foi atingido por mais de 20 disparos de fuzil, obrigando-o a perder o controle e colidir com um ônibus em um cruzamento. Mesmo após o impacto, os assassinos desceram de outro veículo e o executaram a sangue frio.
Segundo o delegado-geral da Polícia Civil, Artur Dian, a ação envolveu técnicas apuradas e armamento pesado, com carregadores de fuzil e munições encontrados em veículos abandonados após o crime. Para a polícia, trata-se de uma ação planejada, executada com alto nível de organização.
Inimigo do PCC
Com mais de 40 anos de carreira, Ruy Ferraz Fontes ocupou cargos estratégicos na Polícia Civil, como diretor do Decap, do Denarc, do DHPP e, sobretudo, delegado-geral. Tornou-se conhecido pela coragem em enfrentar o Primeiro Comando da Capital (PCC). Foi ele quem, em 2006, indiciou toda a cúpula da facção, incluindo Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, em um processo que resultou no isolamento dos líderes na Penitenciária 2 de Presidente Venceslau.
Essa atuação o colocou na mira do crime organizado. Jurado de morte pelo PCC, Fontes seguia sua vida sob constantes ameaças, mesmo após deixar o comando da Polícia Civil.
Histórico de ameaças e atentados
A execução desta semana não foi o primeiro episódio violento em sua trajetória pessoal. Em dezembro de 2023, ele sofreu um assalto em Praia Grande, quando bandidos apontaram uma arma para sua cabeça e roubaram pertences pessoais. Na ocasião, já havia demonstrado preocupação com a exposição e com a segurança de sua família.
Fontes também foi vítima de emboscadas e assaltos em 2022, 2020 e 2012, algumas marcadas por troca de tiros e feridos. Ainda assim, seguia em frente, mesmo reconhecendo que “os bandidos sabiam onde morava”.
Reação imediata das autoridades
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, e o secretário de Segurança, Guilherme Derrite, determinaram prioridade máxima às investigações. Mais de 100 policiais da Rota, do Garra e do Gaeco foram deslocados para Praia Grande em uma megaoperação de busca pelos envolvidos.
A Polícia Federal também se colocou à disposição para auxiliar, oferecendo reforço de agentes e tecnologia de investigação. Segundo as autoridades, todas as hipóteses estão sendo analisadas, inclusive a ligação direta do crime com o PCC.
Um crime planejado
As primeiras análises apontam que o ex-delegado pode ter sido seguido por dias antes da execução. Dois veículos foram encontrados abandonados – um deles incendiado – e são peças-chave na apuração. As equipes analisam imagens de câmeras da região e colhem depoimentos de pessoas próximas.
Para o secretário-executivo da SSP, Osvaldo Nico, a elucidação do crime é questão de honra: “Já estamos no local promovendo diligências e usando ferramentas de inteligência para identificar os criminosos”.
Um legado de enfrentamento
Formado em Direito, com especialização em Administração Pública e cursos internacionais em combate ao narcotráfico e antiterrorismo, Fontes construiu uma carreira marcada pela firmeza contra o crime. Sua morte, entretanto, expõe que a retaliação pode chegar mesmo a quem dedicou a vida a enfrentar o poder paralelo.
A execução de Ruy Ferraz Fontes ecoa como símbolo da ousadia do crime organizado em desafiar o Estado. Mais do que uma tragédia pessoal, é um alerta de que a luta contra facções criminosas ainda exige vigilância, coragem e compromisso. Em meio à dor, fica a reflexão: até que ponto o sacrifício de quem combate o crime será lembrado apenas como estatística, e quando será, de fato, transformado em força para que novas histórias de violência não se repitam?
Texto: Daniela Castelo Branco
Foto: Reprodução
Reportagem: CNN Brasil