Nos bastidores dos relacionamentos contemporâneos, cresce uma tendência que trata o adultério não mais como tabu, mas como oportunidade de prazer e até de negócio. Criado na França, o aplicativo Gleeden surgiu com a proposta de promover encontros extraconjugais em um ambiente “seguro, anônimo e discreto”, voltado especialmente para mulheres.
Desde seu lançamento em 2009, o app expandiu para mais de 150 países, contando atualmente com 13 milhões de usuários no mundo, sendo 1,2 milhão no Brasil. A proposta inicial partiu de um grupo de empresárias feministas francesas que perceberam a ausência de serviços voltados a mulheres insatisfeitas em seus casamentos.
A plataforma, construída sob o discurso de liberdade sexual e autonomia feminina, tem como diferencial o uso gratuito para mulheres, enquanto os homens precisam pagar créditos para se comunicar.
“Quem entra no Gleeden não está buscando o amor da sua vida, mas sim um amante”, declarou Silvia Rubies, diretora de marketing da plataforma para a América Latina e Espanha. Em entrevista à imprensa, Silvia destacou que a maioria dos usuários são pessoas em relacionamentos estáveis. “Temos usuários solteiros, divorciados, viúvos, mas a maioria está em relacionamentos estáveis”, afirmou.
O modelo de negócio do Gleeden transforma o adultério em produto. Cada interação na plataforma tem um custo em créditos pagos, desde a leitura de mensagens até o envio de presentes virtuais. “É uma forma de filtrar quem realmente está disposto a investir na aventura”, explicou Silvia. Além disso, o aplicativo oferece funcionalidades que priorizam o anonimato, como pseudônimos, botão de pânico e a possibilidade de alterar o ícone no celular para disfarçar o uso.
A proposta da empresa se apresenta como um avanço da liberdade individual, porém, em contextos religiosos como o brasileiro — onde a maioria da população se identifica como cristã —, levanta debates sobre os impactos éticos e espirituais desse modelo. O adultério, que tradicionalmente era visto como uma transgressão moral e espiritual, passa a ser oferecido como um serviço acessível, normalizando a quebra da aliança conjugal.
O app, apelidado por alguns veículos como “Tinder da traição”, opera em uma lógica de desvalorização da monogamia e do casamento. Em suas campanhas de marketing, o Gleeden afirma buscar a “desconstrução do modelo monogâmico tradicional”, promovendo a ideia de que relações extraconjugais podem ser vividas sem culpa ou consequência. A linguagem é inclusiva, o discurso é libertário, e os números indicam uma adesão crescente, especialmente em países de base religiosa.
A visão cristã, no entanto, apresenta uma perspectiva distinta. O texto bíblico de Hebreus 13.4 exorta: “O matrimônio seja honrado por todos, e o leito conjugal, conservado puro”. Para os que professam a fé cristã, a aliança matrimonial é um pacto sagrado, não apenas entre duas pessoas, mas diante de Deus. A traição, portanto, ultrapassa o campo da quebra de confiança e representa uma fratura espiritual.
Em entrevista concedida à revista Comunhão, o pastor e teólogo Osiel Gomes, autor do livro O Melhor do Sexo, afirmou: “O prazer sexual no casamento é uma bênção, mas a banalização do corpo e do prazer fora da aliança é a porta larga que conduz à ruína. Quando o sexo vira produto e o desejo vira desculpa, o pacto é rasgado”. Segundo ele, o adultério, embora hoje impulsionado por tecnologias e aplicativos, tem sua origem em vazios emocionais não tratados.
“Esposos que têm o amor de Deus no coração não enxergam o ato sexual como um fim em si mesmo, nem se aproveitam do outro como objeto […] O prazer foi concedido por Deus, mas no contexto da mutualidade e do amor, nunca da infidelidade”, acrescentou o pastor.
No atual cenário, onde a tentação se apresenta de forma acessível e personalizada, com ícones customizáveis e promessas de sigilo absoluto, a fidelidade passou a ser um ato contracultural. Permanecer fiel, buscar reconciliação, dialogar e resistir aos atalhos da infidelidade requer mais do que força de vontade: exige fundamento espiritual e maturidade emocional.
Para o pastor Osiel, a resposta cristã à cultura do prazer imediato deve vir acompanhada de clareza e firmeza: “A criação de tabus sexuais entre cristãos resultou em uma ética denominada ‘tradicional’, mas o erro não está na fidelidade. O erro está em confundir liberdade com licenciosidade. Sexo sem aliança é desordem espiritual disfarçada de prazer”, afirmou.
O crescimento do Gleeden no Brasil revela não apenas a demanda de público para esse tipo de app, mas também a existência de lacunas relacionais — muitas vezes silenciosas — nos casamentos. Aplicativos como esse tornam-se atrativos quando os vínculos estão fragilizados, o diálogo interrompido e o compromisso diluído por promessas de experiências excitantes e sem consequência.
Para quem segue os princípios da fé cristã, o adultério não pode ser visto como uma “experiência”, mas como uma violação da aliança firmada diante de Deus. A fidelidade conjugal é compreendida como sinal de maturidade, respeito e santidade, mesmo quando exige sacrifício ou renúncia. O amor bíblico é mais do que sentimento — é entrega, perseverança e compromisso com a verdade.