O ritmo acelerado de programações em diversas igrejas evangélicas, chamado ativismo religioso, tem provocado uma onda silenciosa de desgaste e afastamento de membros. O acúmulo de cultos, eventos e reuniões, frequentemente interpretado como sinal de vigor ministerial, passou a ser apontado por líderes cristãos como um fator que contribui para o esvaziamento da fé e o cansaço emocional de voluntários e pastores.
Na Igreja Metodista em Guadalupe, no Rio de Janeiro, o pastor Glauco Ferreira tem observado o fenômeno com preocupação. Ele afirma que a dinâmica atual de muitas igrejas assemelha-se a uma engrenagem de tarefas contínuas, na qual “o agir para Deus substitui a vivência com Deus”. Em sua avaliação, essa lógica compromete tanto os vínculos espirituais quanto os relacionamentos interpessoais.
Ferreira alerta que o excesso de atividades, embora movido por boas intenções, tende a gerar desgaste profundo. “Muitas pessoas não se afastam por falta de fé, mas por cansaço de serem tratadas como força de trabalho em vez de filhos e filhas que também precisam ser cuidados”, afirmou.
Na Igreja Batista Atitude, em Vitória (ES), o pastor Sérgio Junger compartilha da mesma avaliação. Segundo ele, quando a agenda da igreja se sobrepõe à comunhão com Deus, corre-se o risco de promover uma espiritualidade superficial. “Quando a agenda se torna mais importante que a comunhão com Deus, corre-se o risco de substituir a espiritualidade por uma rotina estressante e mecânica”, declarou.
Junger observa que muitos líderes seguem atuando mesmo quando já estão esgotados. Em vez de aprofundar a fé, a sobrecarga pode levar ao distanciamento da presença de Deus. Ele acredita que refletir sobre essas práticas não compromete a missão da igreja, mas permite resgatar o equilíbrio entre ação e intimidade espiritual.
Sob a perspectiva reformada, o reverendo Ítalo Reis, pastor da Primeira Igreja Presbiteriana de Natal (RN), acrescenta outro ponto ao debate. Ele afirma que, na teologia reformada, toda a vida é vivida Coram Deo — diante de Deus —, e não apenas nos momentos específicos de culto. Para ele, o ativismo religioso pode refletir uma fé esvaziada, utilizada como compensação moral ou tentativa de controle.
“O problema do ativismo nas igrejas vai além da agenda cheia. Em muitos casos, ele é expressão de uma fé esvaziada, usada como forma de compensação moral ou tentativa de controle espiritual”, afirmou. Para Reis, o serviço cristão deve ser fruto do amor e da gratidão, e não resultado de uma obrigação mecânica.
Apesar das diferenças teológicas, os três líderes convergem quanto à necessidade de revisar o modelo de igreja hiperativa. Glauco Ferreira defende que as comunidades cristãs redescubram o que chama de “ritmo do Reino”, fundamentado em práticas como silêncio, contemplação e cuidado mútuo. Ele propõe menos eventos e mais encontros significativos. “A missão da igreja não está ameaçada pelo descanso. Pelo contrário, ela floresce quando aqueles que servem o fazem com o coração inteiro”, disse.
Sérgio Junger reforça a importância de espaços voltados ao cuidado e à formação emocional dentro das igrejas. Para ele, reduzir o ativismo e valorizar o descanso fortalece o corpo de Cristo e melhora a saúde espiritual dos membros. “Uma igreja saudável é aquela que compreende a necessidade de pausa e de profundidade na caminhada cristã”, afirmou.
O reverendo Ítalo Reis enfatiza a importância de valorizar o cotidiano como espaço de manifestação da presença de Deus. Ele defende o cultivo de práticas como o culto doméstico, o discipulado individual e uma espiritualidade baseada na gratidão e no serviço. “A missão cristã não deve ser tratada como um programa institucional, mas como um estilo de vida enraizado na imitação de Cristo”, declarou, de acordo com a revista Comunhão.