A Transparência Internacional, órgão não governamental que desde 1995 estabelece um ranking de percepção dos países mais corruptos do mundo, fez uma publicação classificando como “escandalosa” a revelação de ligação do Banco Master, alvo em uma investigação bilionária de desvios, com ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
“O contrato de 129M [milhões] da esposa do min. [Alexandre de] Moraes com o Master é o mais escandaloso e grave caso de lobby judicial da história brasileira. O código de ética de Fachin é urgente, mas não suficiente. É fundamental que o Congresso desengavete a regulamentação do lobby e inclua o Judiciário”, comentou a ONG nas redes sociais.
A reação da entidade ocorre após a divulgação de uma matéria da jornalista Malu Gaspar, do jornal O Globo. Segundo a reportagem, a investigação deflagrada pela Operação Compliance Zero, centrada na venda fraudulenta de créditos de R$ 12,2 bilhões do Banco Master ao BRB, enfrentou uma significativa alteração de curso após decisão do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF).
A medida, que impôs sigilo amplo (denominado “sigilo master”) sobre o processo, resultou na paralisação de oitivas, na abertura de novos inquéritos e na realização de perícias nos materiais apreendidos durante a prisão do controlador do banco, Daniel Vorcaro, e outros alvos da operação.
A expectativa inicial era de que a investigação pudesse se expandir para outros ramos dos negócios de Vorcaro e suas conexões políticas. No entanto, a decisão de Toffoli, proferida em novembro de 2023, foi inicialmente percebida como uma contenção desse avanço.
A efetividade dessa contenção foi posta em questão por revelações subsequentes envolvendo os próprios ministros da Corte. Horas antes de decretar o sigilo, o ministro Dias Toffoli viajou para o Peru no jato particular de um empresário, acompanhado do advogado de um dos investigados, para assistir à final da Copa Libertadores. A divulgação dessa viagem trouxe à tona questionamentos sobre a imparcialidade da decisão.
Paralelamente, detalhes sobre os vínculos do ministro Alexandre de Moraes com o Banco Master ganharam nova dimensão. Já era de conhecimento público que o escritório de advocacia de sua esposa, Viviane, e seus filhos, o Barci de Moraes Associados, mantinha contrato com a instituição financeira. O valor do contrato, contudo, foi revelado: R$ 3,6 milhões mensais por um período de três anos, totalizando R$ 129,6 milhões.
O objeto contratual é descrito como amplo, incluindo a defesa do banco e de seus controladores na Justiça e o “acompanhamento de projetos de lei de interesse” do Master no Congresso Nacional.
A natureza específica desses projetos e a atuação do escritório não foram detalhadas pelos envolvidos, que não se manifestaram publicamente. Especialistas do mercado jurídico consideram a remuneração excepcionalmente elevada, mesmo para padrões de grandes escritórios.
Defensores dos ministros argumentam que não há ilegalidade em viagens em aeronaves particulares ou na prestação de serviços de parentes a clientes privados, lembrando que o próprio STF autoriza seus membros a julgar casos de escritórios de familiares. Contudo, a ausência de uma defesa pública mais robusta por parte de aliados habituais dos ministros tem sido notada.
No ambiente político-jurídico, avalia-se que o constrangimento dentro do STF é considerável, com receio de que novas informações possam emergir. A expectativa de setores ligados aos ministros é de que o procurador-geral da República, Paulo Gonet – que teve seu nome indicado com apoio decisivo de Alexandre de Moraes e de Gilmar Mendes – mantenha o processo sob a alçada do Supremo e preserve o sigilo, dificultando o avanço das investigações.
Analistas apontam que, independentemente do desfecho processual, os episódios acentuam uma percepção de deterioração institucional. A relação próxima entre membros da Corte e o poder econômico, somada à atuação em casos que envolvem seus próprios interesses, é vista por observadores como um fator de desgaste para a credibilidade do Tribunal.
Em sessão da CPI do Crime Organizado, o senador Alessandro Vieira (PSDB-SE) fez uma previsão que sintetiza o clima de crise: “Este é um país que já teve presidente preso, já teve ministro preso, senador preso, deputado preso, prefeito, vereador, mas ainda não teve ministros de tribunais superiores. E me parece que esse momento se avizinha”. A declaração reflete um debate crescente sobre os limites da responsabilização de membros do Judiciário no país.








































