O Supremo Tribunal Federal (STF) invalidou norma do Estado de Santa Catarina que proibia o uso de linguagem neutra, sem designação de gênero masculino ou feminino, em escolas e órgãos públicos estaduais. A decisão foi tomada por unanimidade no julgamento virtual da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6925, concluída em 6/5.
A vedação estava prevista no Decreto estadual 1.329/2021, que impedia ainda o uso da chamada “linguagem não binária” – com terminações neutras como “x”, @ ou “u” (elu) – em documentos oficiais.
A ação foi proposta pelo Partido dos Trabalhadores (PT).
De acordo com o partido, a norma de Santa Catarina violava os princípios constitucionais da igualdade, da não-discriminação, da dignidade humana e do direito à educação.
O PT ainda alegou que há pessoas que não se sentem representados pela língua portuguesa que possui dois gêneros gramaticais: masculino e feminino.
“O objetivo é claro: tornar a língua portuguesa inclusiva para pessoas transexuais, travestis, não-binárias, intersexo ou que não se sintam abrangidas pelo uso do masculino genérico”, afirmou o PT no pedido.
Base nacional curricular
O colegiado seguiu o voto do relator, ministro Nunes Marques, que lembrou que o STF, em diversas ocasiões, já definiu que é da União a competência para editar normas que garantam uma base curricular única e nacional para a educação infantil e os ensinos fundamental e médio, como estabelece a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB – Lei 9.394/1996). Marques observou que estados e demais unidades federativas podem atuar de forma concorrente, desde que suas medidas não afetem o que está estabelecido em lei federal.
De acordo com o relator, o STF considera que tanto a proibição do uso de determinada modalidade da língua portuguesa como sua imposição ferem a Constituição Federal. Para Nunes Marques, qualquer tentativa estadual ou municipal de impor mudanças ao idioma por meio de disposição normativa, como se a língua pudesse ser moldada mediante decreto, será ineficaz.
Invalidação de leis
O uso da linguagem neutra substitui os artigos feminino e masculino por um “x”, “e” ou até pela “@” em alguns casos.
Assim, “amigo” ou “amiga” virariam “amigue” ou “amigx”. As palavras “todos” ou “todas” seriam trocadas, da mesma forma, por “todes”, “todxs” ou “tod@s”. A mudança, como é popular principalmente na internet, ainda não tem um modelo definido.
Desde o ano passado, o Supremo tem derrubado leis que proíbem a linguagem neutra. Em fevereiro, o STF invalidou uma lei municipal de Uberlândia (MG), que proibia o uso de “linguagem neutra” e “dialeto não binário” nos currículos e materiais didáticos das escolas públicas e privadas da cidade.
Em abril, o Supremo também invalidou leis municipais que proibiam o ensino da linguagem neutra em cidades do Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Alguns municípios têm como objetivo impedir que instituições de ensino, públicas ou privadas, adotem ou inovem com “novas formas de flexão de gênero e de número das palavras da língua portuguesa” em currículos escolares e editais, quando estas estão “em contrariedade às regras gramaticais consolidadas e previstas nas diretrizes e bases da educação nacional”.
De acordo com a Gazeta do Povo, 18 leis municipais foram questionadas por entidades LBGTs no STF, todas alegavam que não compete aos municípios legislar sobre tema que é exclusivo da União. As entidades afirmam que a lei viola direitos fundamentais, como a liberdade de expressão e a liberdade de ensino.
Atualmente, há projetos de lei no Congresso Nacional, como o PL 198/23, que proíbe o uso, em qualquer contexto ou disciplina, de linguagem que empregue o gênero neutro na educação básica.
Contudo, a proposta ainda aguarda análise nas comissões legislativas e antes de virar lei, precisa ser aprovada na Câmara e no Senado.
Gênero neutro
Na semana passada, o STF também permitiu, por unanimidade, que uma pessoa seja identificada com gênero neutro em seu documento de identificação civil.
No caso, um cidadão havia pedido para trocar o sexo de seu documento após realizar tratamento hormonal e cirurgia de resignação para mudança de gênero.
Porém, a pessoa acabou não se identificando com o novo sexo e fez um novo pedido na Justiça para adotar o gênero neutro em sua identidade civil.
A ministra Nancy Andrighi afirmou que a ação se tratava de uma “questão muito dramática”.
“É muito importante este julgamento. Temos um processo em que a pessoa se deu conta de que não estava bem no segundo sexo. Então não estava bem no primeiro e no segundo concluiu que não estava confortável, não era aquilo que emocionalmente estava passando no coração dela”, argumentou Nancy.
Fonte: Guia-me com informações de O Antagonista e STF