O governo da Tanzânia cancelou o registro da Igreja Glória de Cristo no país em 2 de junho, um dia após o bispo Josephat Gwajima — fundador da denominação e parlamentar do partido governista Chama Cha Mapinduzi (CCM) — ter denunciado, durante um sermão, casos de sequestros e desaparecimentos.
A decisão gerou ampla preocupação entre grupos religiosos e organizações de direitos humanos sobre o estado da liberdade religiosa e da dissidência política no país, especialmente às vésperas das eleições marcadas para outubro.
Segundo informou no último fim de semana a Christian Solidarity Worldwide (CSW), com sede no Reino Unido, Gwajima conclamou os fiéis a participarem de uma campanha de sete dias de oração por justiça e paz, após relatar abusos recentes contra ativistas estrangeiros detidos em Dar es Salaam. No dia seguinte, o Registro de Sociedades cancelou o registro da igreja, alegando que os sermões de Gwajima violavam o Capítulo 337 da Lei das Sociedades, ao fazer declarações “politicamente carregadas” que, segundo o governo, visavam minar a confiança pública.
Fundada por Gwajima, a Igreja Glória de Cristo é conhecida em suaíli como Nyumba ya Ufufuo na Uzima (“A Casa da Ressurreição e da Vida”) e contava, até o fechamento, com mais de 70.000 membros distribuídos por ao menos 2.000 filiais no território tanzaniano, tornando-se um dos movimentos pentecostais mais influentes do país.
Gwajima representa o distrito eleitoral de Kawe no Parlamento e, nos últimos meses, intensificou suas críticas à presidente Samia Suluhu Hassan. Durante o sermão de 1º de junho, ele denunciou publicamente a prisão e os supostos maus-tratos contra os ativistas Boniface Mwangi, do Quênia, e Agather Atuhaire, de Uganda. Ambos foram detidos na capital comercial antes do julgamento do líder da oposição Tundu Lissu por traição. Conforme relatos da Associated Press, os ativistas teriam sido torturados sob custódia e depois deportados.
A tentativa inicial da igreja de obter uma liminar no Tribunal Superior de Dodoma foi prejudicada por erros formais na carta de cancelamento, conforme noticiado pela Baptist Press. Em 12 de julho, a igreja recorreu pela segunda vez à Justiça, mas até o momento nenhuma decisão foi divulgada. O prédio central em Dar es Salaam permanece fechado e vigiado pela polícia, com a presença de um veículo de controle de distúrbios na entrada. Cultos têm ocorrido em residências e, posteriormente, foram transferidos para o Salão Social Tanzanita, no bairro Kimara Korogwe.
No contexto das tensões políticas, a presidente Hassan já havia manifestado publicamente preocupação com o crescimento da influência de Gwajima, alertando contra a “gwajimanização” do partido CCM — termo usado para se referir à postura crítica do bispo dentro da própria legenda. Desde o início de seu mandato, em 2021, após a morte do ex-presidente John Magufuli, Hassan adotou medidas de abertura política, como a revogação da proibição de comícios. No entanto, nos últimos meses, observadores têm apontado sinais de recuo, com deportações de ativistas, restrições a observadores internacionais e alertas contra a ingerência estrangeira.
A oposição também tem enfrentado obstáculos. Em abril, Tundu Lissu foi preso por acusações de incitação e traição — crime punível com pena capital. Ele permanece em julgamento, e organizações de direitos humanos expressaram preocupação quanto à imparcialidade do processo. O principal partido opositor, Chadema, tem defendido reformas no sistema eleitoral.
No dia 6 de julho, a CSW informou que forças policiais foram vistas em um culto da Igreja Evangélica Luterana na Tanzânia, onde ex-membros da Igreja Glória de Cristo se reuniram. Anteriormente, em 8 de maio, o bispo luterano Benson Bagonza, da Diocese de Karagwe, relatou ter recebido ameaças de morte após denunciar sequestros e assassinatos.
Conforme a legislação vigente na Tanzânia, todas as organizações religiosas precisam ser registradas junto ao Registro de Sociedades, com renovações obrigatórias a cada cinco anos. Violações dos termos de registro podem resultar em sanções ou no fechamento da entidade. Em julho de 2024, a Igreja da Vida Cristã, também em Dar es Salaam, teve seu registro revogado após acusações de cobrança indevida por serviços espirituais e mensagens consideradas “contrárias aos valores nacionais”.
De acordo com o The Christian Post, o diretor-executivo da Christian Solidarity Worldwide, Scot Bower, declarou: “O uso das leis de registro para silenciar críticas é profundamente problemático. O fechamento da Igreja Glória de Cristo parece injustificado, especialmente diante das garantias constitucionais de liberdade religiosa, de expressão e de associação”.